terça-feira, 12 de setembro de 2006

Lindo!

"Onde pus a esperança, as rosas
Murcharam logo.
Na casa, onde fui habitar,
O jardim, que eu amei por ser
Ali o melhor lugar,
E por quem essa casa amei –
Deserto o achei,
E, quando o tive, sem razão p’ra o ter.

Onde pus a afeição, secou
A fonte logo.
Da floresta, que fui buscar
Por essa fonte ali tecer
Seu canto de rezar –
Quando na sombra penetrei,
Só o lugar achei
Da fonte seca, inútil de se ter.

P’ra quê, pois, afeição, ‘sperança,
Se perco, logo
Que as uso, a causa p’ras usar,
Se tê-las sabe a não as ter?
Crer ou amar?
Até à raiz, do peito onde alberguei
Tais sonhos e os gozei,
O vento arranque e leve onde quiser
E eu os não possa achar!"


Fernando Pessoa

2 comentários:

Moelas disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...

Mais um desse a quem chamam pessoa, mas que é um entre tantos individuos. :)

"Gozo os campos sem reparar para eles.
Perguntas-me por que os gozo.
Porque os gozo, respondo.
Gozar uma flor é estar ao pé dela inconscientemente
E ter uma noção do seu perfume nas nossas idéias mais apagadas.
Quando reparo, não gozo: vejo.
Fecho os olhos, e o meu corpo, que está entre a erva,
Pertence inteiramente ao exterior de quem fecha os olhos
À dureza fresca da terra cheirosa e irregular;
E alguma cousa dos ruídos indistintos das cousas a existir,
E só uma sombra encarnada de luz me carrega levemente nas órbitas,
E só um resto de vida ouve. "