quarta-feira, 13 de abril de 2011

Se soubesse como o país ia ficar, Otelo teria sido marketeer nos EUA

Otelo Saraiva de Carvalho acaba de lançar um livro que arrisco desde já apelidar de best-seller. O autor, na verdade um talento de marketing desperdiçado na arena militar, faz uso de arrojadas estratégias de promoção da sua obra.

Analisemos pois em detalhe o génio que Portugal desperdiçou:

1) Facto: Otelo sabe que os leitores estão cansados de biografias de líderes de sucesso, exemplos de perseverança e resiliência, pessoas guiadas por sonhos, ideais ou objectivos. Estratégia: Escrever um livro que relata a história do 25 de Abril, hora a hora, e ao mesmo tempo dizer "Não teria feito o 25 de Abril se pensasse que íamos cair na situação em que estamos actualmente. Teria pedido a demissão de oficial do Exército e, se calhar, como muitos jovens têm feito actualmente, tinha ido para o estrangeiro". Lógica: O leitor, surpreendido pela honestidade contida na incoerência de valores, sente-se impelido a consultar a publicação em que a Revolução é descrita por um interveniente que teria hesitado entre destituir o regime ditatorial e trabalhar nos bâtiments em França.

2) Facto: Otelo conhece o êxito dos reality shows. Estratégia: Escrever um livro que relata a história do 25 de Abril, hora a hora, e ao mesmo tempo dizer "(...) nunca mais punha os pés no quartel, pois não queria assumir esta responsabilidade". Lógica: Otelo demonstra que conduziu a revolução sozinho, e, como tal, a descrição que efectua no livro mais não é do que a enumeração dos seus próprios actos naquele dia. Este é um elemento que abre espaço também à expressão de emoções, algo muito apreciado pelos espectadores de reality shows:
"16h00: Caramba pá se tivesse ido com o Armindo prós bâtiments já a esta hora tava de papo cheio, tinha uma francesa em casa à espera e bem me livrava desta alergia aos cravos, raios partam isto, pró que me havia de dar".
3) Facto: Otelo sabe que hoje são as empresas, e não os governos democraticamente eleitos, que gerem o rumo dos países. Estratégia: Escrever um livro que relata a história do 25 de Abril, hora a hora, e ao mesmo tempo afirmar, a propósito da eventualidade de uma nova revolução em Portugal:  "Se a esta gente voluntária cortarem direitos adquiridos, então o caldo está entornado".  Lógica: Ao enquadrar a revolução no quadro de uma reivindicação corporativa, e não de uma luta contra um regime político, Otelo aproxima a sua história da realidade actual, criando um sentimento de identificação por parte do leitor para com o relato.
Próxima edição nas bancas: Otelo, O Marketeer - "Se soubesse como o Marketing ia ficar, não me tinha dedicado à escrita. Ficava com os louros de uma revolução pela qual me atribuem responsabilidade e já me dava por satisfeito".